PROCESSO
Nº:
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547025/10
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ASSUNTO:
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CONSULTA
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ENTIDADE:
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MUNICÍPIO
DE PRIMEIRO DE MAIO
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INTERESSADO:
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JERUBAAL
MATUSALEM ARRUDA
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RELATOR:
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CONSELHEIRO
HERMAS EURIDES BRANDÃO
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ACÓRDÃO Nº 1903/11 - Tribunal
Pleno
CONSULTA. ACÚMULO DE
FUNÇÃO GRATIFICADA COM CARGO DE VEREADOR. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA
SIMETRIA E SEPARAÇÃO DE PODERES. IMPOSSIBILIDADE.
I
– RELATÓRIO
Tratam os presentes autos de Consulta que o
Prefeito Municipal de Primeiro de Maio submete à apreciação desta Corte de
Contas.
A dúvida que traz o consulente é, in verbis:
“...sobre a
possibilidade de um Servidor Municipal, em exercício de função gratificada pelo
Estatuto do Servidor, receber a gratificação em pecúnia, mesmo estando,
concomitantemente, em exercício de Mandato Eletivo na Câmara de Vereadores do
mesmo Município.”
Após ser admitida pelo Relator, a Consulta
seguiu a tramitação de estilo e recebeu opinativos respectivamente da
Coordenadoria de Jurisprudência e Biblioteca (CJB), da Diretoria Jurídica
(DIJUR) e do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas (MPjTC).
A Consulta foi objeto também da manifestação
da Assessoria Jurídica do Município, que, resumidamente, entendeu pela
impossibilidade de acúmulo do exercício da vereança com a ocupação de função
gratificada no Poder Executivo, e por consequência o recebimento em pecúnia da
gratificação, tendo em vista que esta última pressupõe uma relação de
dependência entre o servidor e o chefe que o nomeou para a função e haveria
afronta ao princípio da separação dos poderes.
A CJB esclarece que não foi encontrada
jurisprudência desta Corte acerca da matéria.
A DIJUR e o MPjTC opinam na mesma linha da
assessoria jurídica municipal, ou seja, pela impossibilidade de acúmulo da
função gratificada exercida junto ao Poder Executivo e o Cargo de Vereador.
As Unidades instrutivas são uníssonas ao
afirmar que, em princípio, existe a possibilidade de acúmulo do cargo de
Vereador com cargo, emprego e função pública, desde que haja compatibilidade de
horários, o que está expressamente previsto no artigo 38, III da Constituição
da República.
Entretanto, asseveram que no caso em tela
outros fatores devem ser levados em consideração, fatores estes que impedem uma
resposta positiva à questão formulada.
Tais fatores seriam, em linhas gerais:
- Violação ao princípio da separação de
poderes, uma vez que o agir imparcial estaria comprometido pelo exercício de
cargo ou função de chefia, direção ou assessoramento em outro poder;
- Os cargos de
provimento em comissão exigem uma maior lealdade por parte do ocupante em relação
a quem o nomeou, visto que decorrem de um vínculo de confiança, com a
possibilidade de demissão ad nutum em
caso de quebra dessa confiança;
- O regime de
dedicação dos cargos de provimento em comissão pressupõe a dedicação exclusiva,
o que coloca os comissionados e gratificados em situação de disposição da
autoridade nomeante além do horário dito normal pra os servidores efetivos sem
função gratificada;
- Aplica-se aqui o
princípio constitucional da simetria tendo em vista o contido no artigo 54, II,
“a” c/c artigo 29, IX da Constituição da República, que prevêem:
Art. 54. Os Deputados
e Senadores não poderão:
I - desde a expedição
do diploma:
a) firmar ou manter
contrato com pessoa jurídica de direito público, autarquia, empresa pública,
sociedade de economia mista ou empresa concessionária de serviço público, salvo
quando o contrato obedecer a cláusulas uniformes;
b) aceitar ou exercer
cargo, função ou emprego remunerado, inclusive os de que sejam demissíveis
"ad nutum", nas entidades constantes da alínea anterior;
II - desde a posse:
a) ocupar cargo ou
função de que sejam demissíveis "ad nutum", nas entidades referidas
no inciso I, "a";
Art. 29. O Município
reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de
dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a
promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na
Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos:
(...)
IX - proibições e
incompatibilidades, no exercício da vereança, similares, no que couber, ao
disposto nesta Constituição para os membros do Congresso Nacional e na
Constituição do respectivo Estado para os membros da Assembleia Legislativa;
Concluem DIJUR e MPjTC por responder à
consulta pela impossibilidade do acúmulo da função gratificada com o exercício
do cargo de Vereador e por conseqüência pela impossibilidade do recebimento em
pecúnia relativo à função.
II
– FUNDAMENTAÇÃO E VOTO
Fica claro da leitura dos opinativos que
instruíram os autos que não há como responder de forma diferente a presente
consulta.
Realmente, em que pese haver norma
constitucional prevendo expressamente a possibilidade de acúmulo das atividades
de vereança com cargos, empregos e funções públicas, quando houver
compatibilidade de horários, no caso em tela, outros princípios constitucionais
devem ser levados em consideração.
O princípio da separação dos poderes é o
principal óbice a que um vereador ocupe também uma função gratificada,
principalmente em outro poder, pois não agiria em suas atividades legislativas
com a devida isenção e independência.
Isso decorre do vínculo de confiança a que
está submetido o servidor ocupante de cargo em comissão ou de função
gratificada.
Como bem colocaram DIJUR e MPjTC, a natureza
precária do vínculo poderia comprometer um atuar independente do Vereador nas
suas funções junto ao poder legislativo municipal.
Além disso, entendo que o princípio
constitucional da simetria, como bem colocou a Diretoria Jurídica, também veda
tal acúmulo, conforme se depreende da leitura dos dispositivos constitucionais
citados.
Assim, proponho que se responda a presente
consulta nos seguintes termos:
Tendo em vista os princípios constitucionais
da simetria e da separação dos poderes, a natureza precária derivada da relação
de confiança, e seu regime de dedicação exclusiva, entre o servidor titular de
função gratificada e a autoridade que o nomeou, é incompatível o exercício do
cargo eletivo de vereador cumulado com função gratifica ou cargo em comissão,
bem como a percepção da vantagem pecuniária derivada de tais vínculos.
VISTOS,
relatados e discutidos,
ACORDAM
OS MEMBROS DO TRIBUNAL PLENO do TRIBUNAL
DE CONTAS DO ESTADO DO PARANÁ, nos termos do voto do Relator, Conselheiro HERMAS EURIDES BRANDÃO, por unanimidade, em:
Responder a presente consulta nos seguintes
termos:
Tendo em vista os princípios constitucionais
da simetria e da separação dos poderes, a natureza precária derivada da relação
de confiança, e seu regime de dedicação exclusiva, entre o servidor titular de
função gratificada e a autoridade que o nomeou, é incompatível o exercício do
cargo eletivo de vereador cumulado com função gratifica ou cargo em comissão,
bem como a percepção da vantagem pecuniária derivada de tais vínculos.
Votaram, nos
termos acima, os Conselheiros NESTOR BAPTISTA, CAIO MARCIO NOGUEIRA SOARES,
HERMAS EURIDES BRANDÃO e IVAN LELIS BONILHA e os Auditores JAIME TADEU
LECHINSKI e THIAGO BARBOSA CORDEIRO.
Presente a
Procuradora do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas KATIA REGINA PUCHASKI.
HERMAS EURIDES BRANDÃO
Conselheiro-Relator
ARTAGÃO DE MATTOS LEÃO
Vice-Presidente
no exercício da Presidência